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31 janeiro, 2011

Nuvem


Bem que quis fincar raiz
mas sou nuvem passageira,
mudo de acordo com o tempo
sigo a favor do vento

Quando espessa verto lágrimas
choro até ficar mais leve
até que o vento me leve

Leve-me pra outro horizonte
bem detrás daquele monte
aonde o sol vai se esconder
onde me esconde eu
fugindo do meu bem querer

Quando as lágrimas que chorei
tornarem a me encontrar
eu vou voltar a chorar

Mudando de tempo em tempo
ora leve, ora densa
ora pequena, ora imensa

29 janeiro, 2011

Flores ocultas


encaro a estrada
de frente
mastigo pedras
rumino a faca entre os dentes
fere-me o peso do aço
acumulado
                                                                                                                   obsoleto
das correntes me desfaço
escondo-me nesse oceano deserto
esqueço
                     adormeço
                                              morro

retorno
retrocedo aos laços do retrato
reflexo no espelho que reavivo
recomeço

na manga
uma outra carta

 

24 janeiro, 2011

Viva às mortas

na impossibilidade de ser
resolveu ficar deprimida
foram três horas no sofá

na impossibilidade de ser outra

resolveu voltar a ser mãe
foi até a cozinha
fez pudim, bolo e torta

as outras; estão mortas


23 janeiro, 2011

Soneto a uma amiga


Passaram-se as dores, os dissabores,
a raiva, a tristeza e a depressão
fiz novos amigos, novos amores
e você inda mora no meu coração

Amiga das horas obscuras
amiga das horas doente
teu conselho me trouxe a cura
nunca me vi tão contente

Do outro lado da avenida
ausente no meu tempo e espaço
você vai levando a vida

Nossa amizade permanece atual
é sempre uma alegria te ver
a cada encontro casual


não quero colher frutos
quero ser
enquanto acordo
caminho
e volto

enquanto teclo e penso
enquanto deito meu corpo
sobre o seu

enquanto vivo
quero ser


Janeiro


chove inclinado no vão das telhas
pinga no balde, respinga no chão
as águas de março invade janeiro
invade casas, avenidas...
invade as vidas
transborda
a morte

19 janeiro, 2011

Segredo


não consigo atinar
então vivo a imaginar
parece carregar um peso
não há leveza em seu andar
há uma sombra em seu olhar
que do segredo você saia ileso


meus dias tão iguais
não pode ser
um só triste dia

todos tão tristes
e tão iguais
são os meus dias

que me fazem triste
e nada mais

16 janeiro, 2011

Poesia do momento

Instante mágico
em que você me deu bom dia
paramos um pouco a nos falar
coisas à toa, sem valia
enquanto teus olhos me corriam
enquanto eu te sorria
enquanto um imã nos atraia

Sustentar teu olhar
já não podia
instante mágico
de pura poesia
quebrado pela razão
que chefia a emoção
mas que ficou gravado
feito fotografia
que olhei o dia todo
porque nesse dia
só teu rosto eu via

14 janeiro, 2011

Solitude

imagem by site fotográfico Devian Art










 

agora que me reencontrei
não quero me perder novamente
sempre me tive inteira

no alto do abacateiro
estudando para a prova de geografia
(cada rio e afluentes tinham uma cor diferente)
escondida atrás do toco,
ou quando pulava a cerca
a perambular pelas ruas
para livrar-me de uma surra
sempre me tive inteira
 
a quem reclame da solidão
ela é minha maior riqueza
não posso lhe dar o que não tenho
e tudo que tenho você pode ter

com a porta do coração trancada
(para garantir minha solidão)
estou cá do lado de fora
mas não vejo grande coisa
nessa grande metrópole
ouço sons que desagradam,
os cheiros tapam-me as narinas
queimam a garganta
e a sinusite já não permite
que eu levante os olhos
sem franzir a testa

desgosta-me o que vejo
irrita-me o que escuto

estar só comigo mesma
é tudo o que mais quero
quantas e quantas vezes
desejei ser uma ermitã
viver a esmo,
cheia de idéias vãs
morar numa cabana
comer palmito e banana
nunca ter que passar roupas
sem hora para acordar
nem contas para pagar

quero a paz de um riacho com sua melodia e perfume
quero o cheiro da relva repleta de vagalumes

13 janeiro, 2011

Sempre chove

ontem
dia claro
exuberante sol de verão
faltou-me ânimo
não saí

hoje
dia chuvoso
és meu cúmplice
sem culpa
não saio

12 janeiro, 2011

Vastidão

hoje
pesa-me
as horas, os minutos
o tempo
dói

a vida
digerida
a passos lentos
minguando
vai 


11 janeiro, 2011

Solidão

solidão veste jeans
essa é a sua cor, só que
num desbotamento inverso
carregando ainda mais seu tom
no tamanho certo do meu Universo

10 janeiro, 2011

Preciso de um mata-borrão


nunca fiz rascunhos
não passo nada à limpo
minha vida é cheia de erros



Vi pessoas puxando o galho de uma árvore
no galho havia um ninho
na mão da senhora
tentando colocar de volta,
um passarinho

Quero mais um amor
não quero pensar na velhice ainda
salve-me do frio  que talvez sinta nos ossos
quando ficar velha
salve-me desse medo

Outono

desfolha-se
infinitos perfumes
agasalham o corpo nu
que valsa descalço
no estridente tapete
de folhas

06 janeiro, 2011

Não sou poeta

 o que sopra o vento e
corre pelas minhas veias
são versos a quem não dei ouvidos

o não frear do cotidiano
deixou  angustiante sensação
de poesia aprisionada

estremece-me o corpo
fervilha o meu sangue
na procura do caminho

foge-me aos sentidos
escapa-me aos dedos
morre calada

Face a face

Na sua garganta continha o doce som da música,
que saia de sua boca quase fechada.
Sua face tranquila era o reflexo daquela música
que  ela  sussurrava com tanta naturalidade.
Não conhecia francês, mas sentia a música,
sentia a paz e  o prazer de estar viva e poder cantar.
Até que se deparou com o espelho...
A tranquilidade aos poucos se esvaiu e
foi, então, que não se  reconheceu.
Viu o medo em suas mãos envelhecidas,
que cheias de pudor, pousavam em sua garganta.
Sentiu a tensão endurecendo seu rosto, 
rusgas de preocupação crispavam sua testa,
o contorno de seus olhos e de sua  boca
Cantara, sim, mas como se fosse a outra.
Como se a ela  não lhe fosse permitido cantar,
viu seus olhos brilharem e se comoveu;
aos poucos a música foi sumindo e
dando lugar a um  pavor  sem tamanho.
Recompôs-se nessa nova combinação
e engoliu a seco a realidade

Coletivo

ultrapasso
atropelo
estagno
apavoro
paro

entro...
entram-me
não aperta
não esmaga
que braço de aço
não tem espaço...

cadê meu braço
o quê
tem que ter força no bumbum
ah...
não empurra
vou descer... descem-me
espera!
saio sem o meu braço?
desenlaço...
dá o meu braço
ai-ai! aí peguei
obrigada

não atropela, não empurra
to na fila

... cheguei. to plugada
você me usa
manda e desmanda
sou banco de dados, to presa
conectada no sistema
enfadada

... de novo não
está cheio. lotado
não há meio!
ah! força no bumbum
com licença
empurro
aqui está bom...
ai meu pé

... ufa! finalmente
noite! que glória
liberdade provisória